Informativo EADelta -Junho/2018

20 de junho de 2018 18:21

NOVIDADES LEGISLATIVAS/NORMAS DO EXECUTIVO
• DECRETO Nº 9.364, DE 8 .5.2018
Altera o Regulamento do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial – SENAC, aprovado pelo Decreto nº 61.843, de 5 de dezembro de 1967, para estender benefícios aos usuários dos programas de proteção a pessoas ameaçadas.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/D9364.htm
• DECRETO Nº 9.370, DE 11 .5.2018
Concede indulto especial e comutação de penas às mulheres presas que menciona, por ocasião do Dia das Mães.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/D9370.htm

• DECRETO Nº 9.371, DE 11 .5.2018
Altera o Decreto nº 6.231, de 11 de outubro de 2007, que institui o Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte – PPCAAM.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/D9371.htm

• DECRETO Nº 9.379, DE 21 .5.2018
Autoriza o emprego das Forças Armadas para a garantia da votação e da apuração das eleições de 2018.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/D9379.htm

• DECRETO Nº 9.396, DE 30 .5.2018

Altera o Decreto nº 5.209, de 17 de setembro de 2004, e o Decreto nº 7.492, de 2 de junho de 2011, para reajustar valores referenciais de caracterização das situações de pobreza e de extrema pobreza e os de benefícios do Programa Bolsa Família.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/decreto/D9396.htm

INFORMATIVOS STF

INFORMATIVO 899 STF
DIREITO CONSTITUCIONAL – CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO. COMPETÊNCIA NORMATIVA E INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA
O Plenário do Supremo Tribunal Federal entendeu pela constitucionalidade da Resolução 36/2009 do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que dispõe sobre o pedido e a utilização de interceptações telefônicas, por ter sido editada ao abrigo do art. 130-A, § 2º, I e II, da Constituição Federal, não tendo sido criados novos “requisitos formais de validade” das interceptações, consubstanciando as normas correlatas em regras desejáveis de padronização formal mínima dos ritos adotados nos procedimentos relacionados a interceptações telefônicas, em consonância com as regras previstas na Lei 9.296/1996.

INTEIRO TEOR
O Plenário, por maioria, julgou improcedente o pedido formulado em ação direta ajuizada em face da Resolução 36/2009 do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que dispõe sobre o pedido e a utilização de interceptações telefônicas, no âmbito do Ministério Público (MP), nos termos da Lei 9.296/1996.
De início, as preliminares de não conhecimento foram rejeitadas pelos seguintes argumentos: (a) o ato normativo, de caráter geral e abstrato, foi editado pelo Conselho no exercício de sua competência constitucional e constitui ato primário, sujeito a controle de constitucionalidade, por ação direta, no Supremo Tribunal Federal (STF); e (b) as mudanças promovidas no ato impugnado, por resolução posterior, não implicaram na perda do objeto desta demanda. No que tange à alegação de inépcia apresentada pela Advocacia-Geral da União (AGU), a petição inicial foi considerada suficientemente clara e não contém vícios formais.
No mérito, ao reconhecer sua constitucionalidade, o Colegiado asseverou que a norma foi editada pelo CNMP no exercício das atribuições previstas diretamente no art. 130-A, § 2º, I e II, da Constituição Federal (CF) (1).
Nesse contexto, apenas regulamentou questões administrativas e disciplinares relacionadas ao procedimento de interceptação telefônica, sem adentrar em matéria de direito penal, processual ou relativa a nulidades.
O ato em apreço regulamentou a Lei 9.296/1996 para estabelecer um conjunto de limites à atuação do Parquet, como forma de proteger o jurisdicionado no que se refere (a) ao requerimento de interceptação; (b) ao pedido de prorrogação; e (c) à conclusão do procedimento.
De um lado, em cumprimento ao dever funcional de sigilo (2) (3) (4), o ato normativo enumerou validamente os critérios a serem observados pelos membros do Parquet nos casos de interceptação telefônica, com a finalidade de evitar excessos.
Não foram criados novos “requisitos formais de validade” das interceptações. Tampouco a inobservância dos preceitos contidos na resolução constitui causa de nulidade, mas sim motivo para a instauração de procedimento administrativo disciplinar contra o agente público infrator, pois trata-se de regras ligadas aos deveres funcionais de sigilo na atuação ministerial.
A Corte ressaltou, ainda, que o CNMP possui competência para regular os parâmetros a serem utilizados na análise de processos disciplinares submetidos ao órgão. Em realidade, trata-se de medida conveniente e desejável que confere previsibilidade à atuação do Conselho, bem como oferece segurança jurídica e tratamento isonômico àqueles sujeitos a seu controle.
Por outro lado, padronizou procedimentos formais sobre a matéria, de modo a concretizar o princípio da eficiência (CF, art. 37, caput) (5), cuja observância deve ser tutelada pelo Conselho (CF, art. 130-A, § 2º, II) (1).
A existência de um grau mínimo de uniformização atende ao princípio da eficiência, além de ser conveniente para a continuidade das investigações, especialmente ao se considerar a possibilidade de atuação de mais de um membro do Parquet no mesmo processo e em momentos distintos.
Ademais, ressaltou que o ato questionado está em consonância com a jurisprudência do STF no sentido de que (a) o pedido de prorrogação de interceptação telefônica, para ser válido, deve estar devidamente justificado e fundamentado; e (b) é necessário transcrever o trecho completo da conversa, a fim de permitir sua contextualização, vedada a edição, ainda que dispensada a transcrição completa da interceptação.
Por fim, entendeu que a independência funcional do MP foi preservada. A resolução não impõe uma linha de atuação ministerial, apenas promove a padronização formal mínima dos ritos adotados nos procedimentos relacionados a interceptações telefônicas, em consonância com as regras previstas na Lei 9.296/1996.
Vencido o ministro Marco Aurélio, que acolheu integralmente o pedido inicial, por considerar que o CNMP (a) disciplinou matéria processual penal, cuja competência é privativa da União (CF, art. 22, I) (6); e (b) feriu a independência funcional do MP, em afronta à cláusula constitucional que exige lei complementar para a fixação de suas atribuições.
Vencidos, em parte, os ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes, que julgavam parcialmente procedente o pedido formulado.
(1) Constituição Federal: “Art. 130-A. (…) § 2º Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo lhe: I – zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências; II – zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas. (…)”.
2) Constituição Federal: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…) XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.
3) Lei Complementar 75/1993: “Art. 8º Para o exercício de suas atribuições, o Ministério Público da União poderá, nos procedimentos de sua competência: (…) § 2º Nenhuma autoridade poderá opor ao Ministério Público, sob qualquer pretexto, a exceção de sigilo, sem prejuízo da subsistência do caráter sigiloso da informação, do registro, do dado ou do documento que lhe seja fornecido”.
4) Lei 8.625/1993: “Art. 26. No exercício de suas funções, o Ministério Público poderá: (…) § 2º O membro do Ministério Público será responsável pelo uso indevido das informações e documentos que requisitar, inclusive nas hipóteses legais de sigilo”.
5) Constituição Federal: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (…)”.
(6) Constituição Federal: “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho”.
ADI 4263/DF, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 25.4.2018 (ADI-4263).

INFORMATIVO 900 STF
DIREITO CONSTITUCIONAL – PRERROGATIVA DE FORO
Ao estudarmos o regime jurídico aplicável aos Deputados Federais e Senadores, imperioso se mostra destacar, de início, que as irrenunciáveis prerrogativas não são relacionadas à pessoa do parlamentar, mas sim ao cargo que ocupam, na tentativa de blindá-lo em dique de proteção à autonomia funcional que a importância de sua representatividade impõe.
Não há como renunciar à prerrogativa, mas é possível que o parlamentar renuncie ao mandato, o que pode implicar a perda dessa proteção. Todavia, essa renúncia pode configurar subterfúgio para desloca¬mento de competências constitucionalmente definidas, que não podem ser objeto de escolha pessoal, o que pode implicar o reconhecimento da sub¬sistência da competência do STF para continuidade do julgamento:
“Deputado federal. Renúncia ao mandato. Abuso de direito: reconhecimento da com¬petência do STF para continuidade do julgamento da presente ação penal. (…) Renúncia de mandato: ato legítimo. Não se presta, porém, a ser utilizada como subterfúgio para desloca¬mento de competências constitucionalmente definidas, que não podem ser objeto de escolha pessoal. Impossibilidade de ser aproveitada como expediente para impedir o julgamento em tempo à absolvição ou à condenação e, neste caso, à definição de penas. No caso, a renúncia do mandato foi apresentada à Casa Legislativa em 27 10 2010, véspera do julgamento da presente ação penal pelo Plenário do Supremo Tribunal: pretensões nitidamente incom¬patíveis com os princípios e as regras constitucionais porque exclui a aplicação da regra de competência deste Supremo Tribunal. (…) As provas documentais e testemunhais revelam que o réu, no cargo de diretor financeiro da Assembleia Legislativa do Estado de Rondônia, praticou os crimes de peculato, na forma continuada, e de quadrilha narrados na denúncia, o que impõe a sua condenação. Questão de ordem resolvida no sentido de reconhecer a sub-sistência da competência deste STF para continuidade do julgamento.” (AP 396, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 28 10 2010, Plenário, DJE de 28 4 2011.) Vide: AP 333, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 5 12 2007, Plenário, DJE de 11 4 2008.
No âmbito das imunidades e prerrogativas, mais precisamente no tocante ao foro especial por prerrogativa de função, houve mudança de entendimento antes consolidado no Supremo Tribunal Federal, que passou a reconhecer, em nova linha interpretativa, a aplicação do foro por prerrogativa de função apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo (nexo temporal) e relacionados às funções desempenhadas (nexo funcional).
A norma constitucional não sofreu alterações, mas sim a realidade fática e a percepção social dos valores, conforme a teoria tridimensional do direito de Miguel Reale (Fato, valor e norma).

ENTENDIMENTO ANTERIOR ENTENDIMENTO ATUAL
(INFORMATIVO 900)
Relação dos fatos com as funções
(crimes cometidos no exercício do mandato)
Deputados Federais e Senadores eram julgados pelo Supremo Tribunal Federal quando a ele imputados infrações penais comuns (não se confundindo com os crimes de responsabilidade), inclusive crimes contra a vida, crimes eleitorais, e os crimes de menor potencial ofensivo, seja ou não relacionado com suas funções. Relação dos fatos com as funções
(crimes cometidos no exercício do mandato)
Deputados Federais e Senadores eram julgados pelo Supremo Tribunal Federal quando a ele imputados infrações penais comuns (não se confundindo com os crimes de responsabilidade), inclusive crimes contra a vida, crimes eleitorais, e os crimes de menor potencial ofensivo, se relacionado com suas funções.
Relação dos fatos com as funções
(crimes cometidos ANTES do exercício do mandato)
O processo em curso quando da diplomação era remetido ao Supremo Tribunal Federal, considerando-se válidos os atos já praticados. Relação dos fatos com as funções
(crimes cometidos ANTES do exercício do mandato)
O processo em curso quando da diplomação não mais é remetido ao Supremo Tribunal Federal.
Extinção do Mandato
Com a extinção do mandato, cessa o foro e os autos são encaminhados/devolvidos ao primeiro grau. Extinção do Mandato
Com a extinção do mandato, temos duas situações:
– A instrução processual ainda está em curso: os autos são remetidos para a 1ª instância.

– A instrução processual já se encerrou: os autos permanecem no STF.

INTEIRO TEOR
O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas.
Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo.
Esse é o entendimento do Plenário, ao resolver questão de ordem para determinar a baixa de ação penal ao juízo da zona eleitoral para posterior julgamento, tendo em vista que: a) os crimes imputados ao réu não foram cometidos no cargo de deputado federal ou em razão dele; b) o réu renunciou ao cargo para assumir a função de prefeito; e c) a instrução processual se encerrou perante a 1ª instância, antes do deslocamento de competência para o Supremo Tribunal Federal (STF) (Informativos 867 e 885).
Prevaleceu o voto do ministro Roberto Barroso (relator), o qual registrou que a quantidade de pessoas beneficiadas pelo foro e a extensão que se tem dado a ele, a abarcar fatos ocorridos antes de o indivíduo ser investido no cargo beneficiado pelo foro por prerrogativa de função ou atos praticados sem qualquer conexão com o exercício do mandato que se deseja proteger, têm resultado em múltiplas disfuncionalidades.
A primeira delas é atribuir ao STF uma competência para a qual ele não é vocacionado. Nenhuma corte constitucional no mundo tem a quantidade de processos de competência originária, em matéria penal, como tem a do Brasil. E, evidentemente, na medida em que desempenha esse papel de jurisdição penal de primeiro grau, o STF se afasta da sua missão primordial de guardião da Constituição e de equacionamento das grandes questões nacionais.
O procedimento no Supremo é muito mais complexo do que no juízo de primeiro grau, por essa razão leva-se muito mais tempo para apreciar a denúncia, processar e julgar a ação penal. Consequentemente, é comum a ocorrência de prescrição, o que nem sempre acontece por responsabilidade do Tribunal, mas por conta do próprio sistema.
Portanto, o mau funcionamento do sistema traz, além de impunidade, desprestígio para o STF. Como consequência, perde o Direito Penal o seu principal papel, qual seja, o de atuar como prevenção geral.
O relator frisou que a situação atual revela a necessidade de mutação constitucional. Isso ocorre quando a corte constitucional muda um entendimento consolidado, não porque o anterior fosse propriamente errado, mas porque: a) a realidade fática mudou; b) a percepção social do Direito mudou; ou c) as consequências práticas de uma orientação jurisprudencial se revelaram negativas. As três hipóteses que justificam a alteração de uma linha de interpretação constitucional estão presentes na hipótese dos autos.
A nova interpretação prestigia os princípios da igualdade e republicano, além de assegurar às pessoas o desempenho de mandato livre de interferências, que é o fim pretendido pela norma constitucional. Ademais, viola o princípio da igualdade proteger, com foro de prerrogativa, o agente público por atos praticados sem relação com a função para a qual se quer resguardar sua independência, o que constitui a atribuição de um privilégio.
Além disso, o princípio republicano tem como uma das suas dimensões mais importantes a possibilidade de responsabilização dos agentes públicos. A prescrição, o excessivo retardamento e a impunidade, que resultam do modelo de foro por prerrogativa de função, não se amoldam ao referido princípio.
A Corte registrou que essa nova linha interpretativa deve ser aplicada imediatamente aos processos em curso, com a ressalva de todos os atos praticados e decisões proferidas pelo STF e pelos demais juízos com base na jurisprudência anterior, conforme precedente firmado no Inq. 687 QO/SP (DJU de 25.8.1999).
Vencidos, em parte, os ministros Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski, apenas quanto à restrição do foro aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. Ambos consideraram que a expressão “nas infrações penais comuns”, prevista no art. 102, I, “b”, da Constituição Federal, alcança todos os tipos de infrações penais, ligadas ou não ao exercício do mandato.
Vencido, em parte, o ministro Marco Aurélio, tão somente quanto à prorrogação da competência para processar e julgar ações penais após a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais.
Vencido, em parte, o ministro Dias Toffoli, que, em voto reajustado, resolveu a questão de ordem no sentido de: a) fixar a competência do STF para processar e julgar os membros do Congresso Nacional exclusivamente quanto aos crimes praticados após a diplomação, independentemente de sua relação ou não com a função pública em questão; b) fixar a competência por prerrogativa de foro, prevista na Constituição Federal, quanto aos demais cargos, exclusivamente quanto aos crimes praticados após a diplomação ou a nomeação (conforme o caso), independentemente de sua relação ou não com a função pública em questão; c) serem inaplicáveis as regras constitucionais de prerrogativa de foro quanto aos crimes praticados anteriormente à diplomação ou à nomeação (conforme o caso), hipótese em que os processos deverão ser remetidos ao juízo de primeira instância competente, independentemente da fase em que se encontrem; d) reconhecer a inconstitucionalidade das normas previstas nas Constituições estaduais e na Lei Orgânica do Distrito Federal que contemplem hipóteses de prerrogativa de foro não previstas expressamente na Constituição Federal, vedada a invocação de simetria; e) estabelecer, quando aplicável a competência por prerrogativa de foro, que a renúncia ou a cessação, por qualquer outro motivo, da função pública que atraia a causa penal ao foro especial, após o encerramento da fase do art. 10 da Lei 8.038/1990, com a determinação de abertura de vista às partes para alegações finais, não altera a competência para o julgamento da ação penal.
Por fim, vencido, também parcialmente, o ministro Gilmar Mendes, que assentou que a prerrogativa de foro alcança todos os delitos imputados ao destinatário da prerrogativa, desde que durante a investidura, sendo desnecessária a ligação com o ofício. Ao final, propôs o início de procedimento para a adoção de Enunciado da Súmula Vinculante em que restasse assentada a inconstitucionalidade de normas de Constituições Estaduais que disponham sobre a competência do Tribunal de Justiça para julgar autoridades sem cargo similar contemplado pela Constituição Federal e a declaração incidental de inconstitucionalidade dos incisos II e VII do art. 22 da Lei 13.502/2017; dos incisos II e III e parágrafo único do art. 33 da Lei Complementar 35/1979; dos artigos 40, III, V, e 41, II, parágrafo único, da Lei 8.625/1993; e do art. 18, II, “d”, “e”, “f”, parágrafo único, da Lei Complementar 75/1993.
AP 937 QO/RJ, rel. Min. Roberto Barroso, julgamento em 2 e 3.5.2018. (AP-937)

INFORMATIVO 901 STF
DIREITO CONSTITUCIONAL – AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: MINISTRO DE ESTADO E FORO COMPETENTE
Consoante os comentários do Informativo 900 STF, no âmbito das imunidades e prerrogativas, mais precisamente no tocante ao foro especial por prerrogativa de função, houve mudança de entendimento antes consolidado no Supremo Tribunal Federal, que passou a reconhecer, em nova linha interpretativa, a aplicação do foro por prerrogativa de função apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo (nexo temporal) e relacionados às funções desempenhadas (nexo funcional).
Com efeito, os Deputados Federais e Senadores serão julgados pelo Supremo Tribunal Federal somente quando a ele imputados infrações penais comuns (não se confundindo com os crimes de responsabilidade), inclusive crimes contra a vida, crimes eleitorais, e os crimes de menor potencial ofensivo, se relacionado com suas funções e se cometidos no exercício do cargo eletivo.
Todavia, conforme Informativo 901 STF, em relação à responsabilização civil pelos atos de improbidade administrativa, como regra geral, não há que se falar em foro especial por prerrogativa de função. A única exceção ao referido regime sancionatório em matéria de improbidade se refere aos atos praticados pelo Presidente da República, conforme previsão expressa do art. 85, inciso V, da CF.
INTEIRO TEOR
Os agentes políticos, com exceção do Presidente da República, encontram-se sujeitos a duplo regime sancionatório, de modo que se submetem tanto à responsabilização civil pelos atos de improbidade administrativa quanto à responsabilização político-administrativa por crimes de responsabilidade.
O foro especial por prerrogativa de função previsto na Constituição Federal (CF) em relação às infrações penais comuns não é extensível às ações de improbidade administrativa.
Esse o entendimento do Plenário ao negar provimento a agravo regimental em petição no qual se sustentava que os agentes políticos respondem apenas por crimes de responsabilidade, mas não pelos atos de improbidade administrativa previstos na Lei 8.429/1992. O requerente também pleiteava o reconhecimento da competência do STF para processar e julgar ações de improbidade contra réus com prerrogativa de foro nesse Tribunal.
Em relação ao duplo regime sancionatório, a Corte concluiu que não há qualquer impedimento à concorrência de esferas de responsabilização distintas. Assim, carece de fundamento constitucional a tentativa de imunizar os agentes políticos das sanções relativas à ação de improbidade administrativa a pretexto de que essas seriam absorvidas pelo crime de responsabilidade. Em realidade, a única exceção ao referido regime sancionatório em matéria de improbidade se refere aos atos praticados pelo Presidente da República, conforme previsão expressa do art. 85, V (1), da CF.
Já no concernente à extensão do foro especial, o Tribunal afirmou que o foro privilegiado é destinado a abarcar apenas as ações penais. A suposta gravidade das sanções previstas no art. 37, § 4º (2), da CF, não reveste a ação de improbidade administrativa de natureza penal.
O foro especial por prerrogativa de função submete-se a regime de direito estrito, já que representa exceção aos princípios estruturantes da igualdade e da República. Não comporta, portanto, ampliação a hipóteses não expressamente previstas no texto constitucional. Isso especialmente porque, na hipótese, não há lacuna constitucional, mas legítima opção do poder constituinte originário em não instituir foro privilegiado para o processo e o julgamento de agentes políticos pela prática de atos de improbidade na esfera civil.
Ademais, a fixação de competência para julgar a ação de improbidade no primeiro grau de jurisdição, além de constituir fórmula republicana, é atenta às capacidades institucionais dos diferentes graus de jurisdição para a instrução processual.
Vencido o Ministro Teori Zavascki (relator), que deu provimento ao agravo regimental. Reconheceu a existência do duplo regime sancionatório, porém, assegurou a observância do foro por prerrogativa de função em relação às ações de improbidade administrativa.
(1) CF: “Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: (…) V – a probidade na administração”.
(2) CF: “Art. 37 (…) § 4º – Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.
Pet 3240 AgR/DF, rel. Min. Teori Zavascki, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgamento em 10.5.2018. (Pet-3240)

DIREITO AMBIENTAL E DIREITO PENAL – PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E PESCA NO PERÍODO DE DEFESO
Com relação à aplicação do princípio da insignificância aos crimes ambientais, tínhamos antes, como referência, uma decisão pela sua possibilidade. Isto se deu em um caso de flagrante de um pescador amador, que, valendo-se de apetrechos proibidos, realizava atos de pesca na represa de Água Vermelha, Rio Grande, município de Mira Estrela/SP. Na ocasião, havia 02kg de peixe na rede malhada. Por estarem vivos, foram eles soltos pelos policiais (HC 93.859/SP – 2009 – STJ).
Em desconfiança acadêmica, imaginava-se, em razão da tutela ambiental em ascendência, que os Tribunais Superiores, em futuro próximo, iriam se pronunciar de maneira mais pro natura. E foi o que ocorreu no julgamento do HC 122560/SC. O Supremo Tribunal Federal desconsiderou a alegação de irrelevância do dano ambiental causado pela pesca de sete quilos de camarão e afirmou que a natureza do bem protegido — o meio ambiente — afasta a construção jurisprudencial do crime de bagatela.

INTEIRO TEOR
O princípio da bagatela não se aplica ao crime previsto no art. 34, “caput” c/c parágrafo único, II, da Lei 9.605/1998 (1).
Com base nesse entendimento, a Primeira Turma denegou a ordem de “habeas corpus” em que se pleiteava a aplicação do princípio da insignificância à realização de pesca em período de defeso com o uso de método não permitido, ante a alegada irrelevância do dano ambiental causado pela pesca de sete quilos de camarão.
A Turma afirmou que as circunstâncias da prática delituosa não afastam a configuração do tipo penal. Tais circunstâncias devem repercutir na fixação da pena. Ademais, a natureza do bem protegido — o meio ambiente — afasta a construção jurisprudencial do crime de bagatela.
(1) Lei 9.605/1998: “Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente: Pena – detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem: (…) II – pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos”.
HC 122560/SC, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 8.5.2018. (HC-122560)

INFORMATIVOS STJ

INFORMATIVO 623 STJ
TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE ENTORPECENTES. DISQUE DENÚNCIA. AUSÊNCIA DE PRÉVIA INVESTIGAÇÃO POLICIAL PARA VERIFICAR A VERACIDADE DAS INFORMAÇÕES RECEBIDAS. FUGA DE ACUSADO. INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS IDÔNEOS PARA ENTRADA EM DOMICÍLIO SEM ORDEM JUDICIAL.
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que a existência de “denúncias anônimas” somada à fuga do acusado, por si só, não configuram fundadas razões a autorizar o ingresso policial no domicílio do acusado sem o seu consentimento ou determinação judicial.
Para o STJ, não houve uma investigação com vistas a verificar a procedência das notícias anônimas, não se considerando ainda como elemento justificante a mera fuga ante a iminente abordagem policial, razão pela qual não foram reunidos elementos mínimos a justificar a entrada no domicílio, em ofensa ao direito fundamental da inviolabilidade do domicílio, insculpido no art. 5°, inc. XI, da Constituição da República, envenenando a descoberta, como elemento de prova, de drogas em depósito no local.
Com esse entendimento, decidiu-se por determinar o trancamento da Ação Penal n. 0001783-23.2016.8.26.0695, baseada em inquérito policial iniciado por auto de prisão em flagrante diante da apreensão de 132 pedras de crack, 84 papelotes de cocaína e ainda 26 trouxinhas de maconha.
Em meu parecer, a norma constitucional de inviolabilidade do domicílio foi valorada de maneira divorciada dos fatos, como se o Direito se resumisse à ordem normativa, observando-se, sem maiores esforços, omissão clara de embasamento judicial, que optou por não enfrentar aspectos prejudiciais da juridicidade da atuação policial no campo da legalidade, da ilicitude ou da licitude, nem enfrentar os limites e contornos entre a margem de legalidade e autonomia de vontade do indivíduo, que procurou se escusar ao menos de declinar a sua qualificação, por certo em desobediência à ordem legal de não evasão emanada por policiais.
INTEIRO TEOR
Na hipótese, verifica-se ofensa ao direito fundamental da inviolabilidade do domicílio, determinado no art. 5°, inc. XI, da Constituição da República, pois, não há referência à prévia investigação policial para verificar a possível veracidade das informações recebidas, não se tratando de averiguação de informações concretas e robustas acerca da traficância naquele local. Ainda que o tráfico ilícito de drogas seja um tipo penal com vários verbos nucleares, e de caráter permanente em alguns destes verbos, como por exemplo “ter em depósito”, não se pode ignorar o inciso XI do artigo 5º da Constituição Federal e esta garantia constitucional não pode ser banalizada, em face de tentativas policiais aleatórias de encontrar algum ilícito em residências. Conforme entendimento da Suprema Corte e da Sexta Turma deste STJ, a entrada forçada em domicílio, sem uma justificativa prévia conforme o direito, é arbitrária, e não será a constatação de situação de flagrância, posterior ao ingresso, que justificará a medida, pois os agentes estatais devem demonstrar que havia elemento mínimo a caracterizar fundadas razões (justa causa).
RHC 83.501-SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, por unanimidade, julgado em 06/03/2018, DJe 05/04/2018.

DEPOSITÁRIO JUDICIAL QUE VENDE OS BENS EM SEU PODER. AUSÊNCIA DA OCUPAÇÃO DE CARGO PÚBLICO. PECULATO. ATIPICIDADE
A questão central discutida no âmbito do HC 402.949-SP foi sobre a possibilidade de se imputar o crime de peculato ao depositário judicial que vende os bens sob sua guarda.
Sobre o tema, temos que abordar inicialmente o art. 327 do CPB, in verbis:
Art. 327 – Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º – Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.
§ 2º – A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.
E na consideração de funcionário público, embora a decisão do STJ tenha sido pouco precisa, temos que distinguir função pública, como exercício de um dever (ex.: jurado/mesário, advogado dativo, funcionário direto da EBCT), de encargo público, como prestação de um favor (ex.: o administrador judicial, inventariante dativo, o tutor dativo e o curador dativo).
Como o administrador judicial não exerce função pública, mas um encargo público, não pode ser considerado funcionário público, razão pela qual não deve a ele ser imputado o crime de peculato, salvo em caso de concurso de agente com quem ostente condição descrita no art. 327 do CPB.
INTEIRO TEOR
De início, verifica-se que o depositário judicial não ocupa cargo criado por lei, não recebe vencimento, tampouco tem vínculo estatutário. Trata-se de uma pessoa que, embora tenha de exercer uma função no interesse público do processo judicial, é estranha aos quadros da justiça e, pois, sem ocupar qualquer cargo público, exerce um encargo por designação do juiz (munus público). Não ocupa, de igual modo, emprego público nem função pública. É, na verdade, um auxiliar do juízo que fica com o encargo de cuidar de bem litigioso. Não se satisfaz, em tal caso, a figura típica do art. 312 do Código Penal, porque não há funcionário público, para fins penais, nos termos do art. 327 do Código Penal, em razão da ausência da ocupação de cargo público. Não basta, como se vê, à caracterização do peculato, o fato de o agente ser considerado funcionário público. É preciso mais. Que ele se aproprie do bem em razão do cargo público que exerça. Essa relação entre o agente e o cargo público é inarredável no crime de peculato.
HC 402.949-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, por unanimidade, julgado em 13/03/2018, DJe 26/03/2018

HOMICÍDIO. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. DOLO EVENTUAL. AUSÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS EXCEDENTES AO TIPO. DESCLASSIFICAÇÃO. HOMICÍDIO CULPOSO.
Nesse interessante caso, o STJ entendeu que o dolo eventual não se presume ao considerar, por si só, a embriaguez ao volante, posicionando-se no sentido da necessidade de reunir elementos de prova que permitam ao menos suscitar a possível presença de um estado anímico compatível com o de quem anui com o resultado morte.
No dolo eventual, temos a vontade consciente de praticar uma conduta assumindo o risco de alcançar um resultado previsto, com relevância penal, em relação ao qual se é indiferente.
Um motorista, ainda que dirigindo sob influência alcoólica, pode ter a conduta de minimizar os riscos, dirigindo com a prudência que lhe resta. Pela Teoria da Representação no Dolo Eventual, o resultado deve ser previsível e de possível “representação”. Ao decidir respeitar as demais leis de trânsito, o motorista se nega a agir com tolerância a um determinado resultado típico de “visualização antecipada”.

INTEIRO TEOR
De início, pontua-se que considerar que a embriaguez ao volante, de per si, já configuraria a existência de dolo eventual equivale admitir que todo e qualquer indivíduo que venha a conduzir veículo automotor em via pública com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool responderá por homicídio doloso, ao causar, por violação a regra de trânsito, a morte de alguém. Não se descura que a embriaguez ao volante é circunstância negativa que deve contribuir para a análise do elemento anímico que move o agente. Todavia, não é a melhor solução estabelecer-se, como premissa aplicável a qualquer caso relativo a delito viário, no qual o condutor esteja sob efeito de bebida alcoólica, que a presença do dolo eventual é o elemento subjetivo ínsito ao comportamento, a ponto de determinar que o agente seja submetido a Júri Popular mesmo que não se indiquem quaisquer outras circunstâncias que confiram lastro à ilação de que o acusado anuiu ao resultado lesivo. O estabelecimento de modelos extraídos da praxis que se mostrem rígidos e impliquem maior certeza da adequação típica por simples subsunção, a despeito da facilidade que ocasionam no exame dos casos cotidianos, podem suscitar desapego do magistrado aos fatos sobre os quais recairá a imputação delituosa, afastando, nessa medida, a incidência do impositivo direito penal do fato. Diferente seria a conclusão se, por exemplo, estivesse o condutor do automóvel dirigindo em velocidade muito acima do permitido, ou fazendo, propositalmente, zigue-zague na pista, ou fazendo sucessivas ultrapassagens perigosas, ou desrespeitando semáforos com sinal vermelho, postando seu veículo em rota de colisão com os demais apenas para assustá-los, ou passando por outros automóveis “tirando fino” e freando logo em seguida etc. Enfim, situações que permitissem ao menos suscitar a possível presença de um estado anímico compatível com o de quem anui com o resultado morte. Assim, não se afigura razoável atribuir a mesma reprovação a quem ingere uma dose de bebida alcoólica e em seguida dirige em veículo automotor, comparativamente àquele que, após embriagar-se completamente, conduz automóvel na via.
REsp 1.689.173-SC, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, por maioria, julgado em 21/11/2017, DJe 26/03/2018.

CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. DADOS BANCÁRIOS OBTIDOS PELA RECEITA FEDERAL. COMPARTILHAMENTO COM O MINISTÉRIO PÚBLICO. LICITUDE DA PROVA
Considerando o posicionamento do STF no sentido da possibilidade de fornecimento de informações sobre movimentações financeiras diretamente ao Fisco, sem autorização judicial, não há embaraços legais à denúncia em processo penal apresentada com base em provas reunidas por meio de compartilhamento pelo Fisco de informações bancárias obtidas sem autorização judicial, porquanto, assim como o sigilo é transferido, sem autorização judicial, da instituição financeira ao Fisco e deste à Advocacia-Geral da União, para cobrança do crédito tributário, também o é possível ao Ministério Público, como titular da ação penal.
INTEIRO TEOR
O plenário do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o RE 601.314-SP, Rel. Min. Edson Fachin, DJe 16/09/2016, e após reconhecer a repercussão geral da matéria, assentou a constitucionalidade do art. 6º da Lei Complementar n. 105/2001, que autoriza o fornecimento de informações sobre movimentações financeiras diretamente ao Fisco, sem autorização judicial. Por seu turno, há reiteradas decisões do STF, afirmando que deve ser estendida a compreensão fixada no julgamento do RE 601.314-SP à esfera criminal, sendo legítimos “[…] os meios de obtenção da prova material e sua utilização no processo Administrativo fiscal, mostra-se lícita sua utilização para fins da persecução criminal. Sobretudo, quando se observa que a omissão da informação revelou a efetiva supressão de tributos, demonstrando a materialidade exigida para configuração do crime previsto no art. 12, inciso I, da Lei n. 8.137/1990, não existindo qualquer abuso por parte da Administração Fiscal em encaminhar as informações ao Parquet” (ARE n. 953.058-SP, Ministro Gilmar Mendes). Com isso, o entendimento de que é incabível o uso da chamada prova emprestada do procedimento fiscal em processo penal, tendo em vista que a obtenção da prova (a quebra do sigilo bancário) não conta com autorização judicial, contraria a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal de que é possível a utilização de dados obtidos pela Secretaria da Receita Federal, em regular procedimento administrativo fiscal, para fins de instrução processual penal. Nesse sentido, não há que se falar em ilicitude das provas que embasam a denúncia em processo penal obtidas por meio de compartilhamento pelo Fisco de informações sobre movimentação bancária obtidos sem autorização judicial, porquanto, assim como o sigilo é transferido, sem autorização judicial, da instituição financeira ao Fisco e deste à Advocacia-Geral da União, para cobrança do crédito tributário, também o é ao Ministério Público, sempre que, no curso de ação fiscal de que resulte lavratura de auto de infração de exigência de crédito de tributos e contribuições, se constate fato que configure, em tese, crime contra a ordem tributária.
HC 422.473-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, por unanimidade, julgado em 20/03/2018, DJe 27/03/2018

INFORMATIVO 624 STJ
CRIME DO ART. 54 DA LEI N. 9.605/1998. NATUREZA FORMAL DO DELITO. REALIZAÇÃO DE PERÍCIA. DESNECESSIDADE. POTENCIALIDADE DE DANO À SAÚDE.
O Informativo 624 STJ pode, com as vênias de estilo, induzir a erro o leitor quando se afirma ser desnecessária a perícia para fins de constatação do crime do art. 54 da Lei 9.605/1998. A generalidade, nesse caso, não é uma convidada de honra ao ambiente acadêmico.
Explico. Inicialmente, é importante realizar uma leitura atenta do art. 54 da Lei 9.605/1998, in verbis:
Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:
Pena – reclusão, de um a quatro anos, e multa.
§ 1º Se o crime é culposo:
Pena – detenção, de seis meses a um ano, e multa.
§ 2º Se o crime:
I – tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;
II – causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;
III – causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade;
IV – dificultar ou impedir o uso público das praias;
V – ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos:
Pena – reclusão, de um a cinco anos.
§ 3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível

Com relação ao caput, há dois pontos que necessariamente devemos pôr em relevo. Em primeiro, considerando a expressão “níveis tais”, a norma expressamente invoca a necessidade de termos níveis de referência, como limites a não transpor. E tais limites, não estão previstos no art. 54 da Lei 9.605/1998, razão pela qual temos uma norma em branco. A Resolução 357/2005 do Conselho Nacional de Meio Ambiente, como exemplo, dispõe sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes ambientais para o seu enquadramento, bem como estabelece as condições e padrões de lançamento de efluentes, e dá outras providências.
Ora, para verificar os padrões de qualidade das águas determinados na Resolução 357/2005 – CONAMA, se além ou não dos limites individuais estabelecidos para cada substância em cada classe, faz-se necessária uma perícia, por meio de avaliação ecotoxicológica, como ferramenta apropriada para evidenciar a biodisponibilidade de substâncias individuais, ou um conjunto destas, presentes em amostras.
Ainda no mesmo exemplo, por mais que o aspecto de determinada água superficial indique a poluição, esta somente pode ser constatada recorrendo-se aos ensaios de toxicidade. Note-se, então, que o crime é “não transeunte”, ou seja, deixa vestígios, de maneira que o exame pericial é necessário e somente pode ser dispensado em hipóteses restritivas.
Em segundo, quando constatado nível de substância para além do permitido, temos a desnecessidade de se constatar um dos três resultados naturalísticos possíveis: 1) danos à saúde human; 2) a mortandade de animais; ou 3) a destruição significativa da flora. Isto em razão da natureza formal do crime.
Assim, com relação ao caput, temos:
Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:
NECESSITA DE PERÍCIA NÃO NECESSITA DE PERÍCIA
. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora.

Prosseguindo, especificamente em relação ao art. 54, §2º, inciso V, da Lei 9.605/1998: Se o crime ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos.
Nesse caso, temos um crime de forma vinculada, em que o legislador narrou uma conduta pontual, admitindo como potencialmente lesivo ao meio ambiente o ato de lançar resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos.
Assim, faz-se necessário apenas verificar se o lançamento se deu conforme exigências estabelecidas ou não, o que prescinde de avaliação ecotoxicológica.
Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:

§ 2º Se o crime:
I – tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana;
II – causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população;
III – causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade;
IV – dificultar ou impedir o uso público das praias;
V – ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos:

NÃO NECESSITA DE PERÍCIA NÃO NECESSITA DE PERÍCIA
V – ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos:
que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora.

INTEIRO TEOR
Cinge-se a controvérsia a saber se é necessária a realização de perícia técnica para a comprovação do dano efetivo à saúde humana no que tange à caracterização de crime ambiental consubstanciado em causar poluição de qualquer natureza. Quanto ao ponto, o acórdão embargado entendeu que “o delito previsto na primeira parte do art. 54 da Lei n. 9.605/1998 exige prova do risco de dano, sendo insuficiente para configurar a conduta delitiva a mera potencialidade de dano à saúde humana”. Já para o acórdão paradigma, “o delito previsto na primeira parte do artigo 54, da Lei n. 9.605/1998, possui natureza formal, porquanto o risco, a potencialidade de dano à saúde humana, é suficiente para configurar a conduta delitiva, não se exigindo, portanto, resultado naturalístico e, consequentemente, a realização de perícia” (AgRg no REsp 1.418.795-SC, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellize, Rel. para acórdão Regina Helena Costa, Quinta Turma, DJe 7/8/2014). Deve prevalecer o entendimento do acórdão paradigma e nos casos em que forem reconhecidas a autoria e a materialidade da conduta descrita no art. 54, § 2º, V, da Lei n. 9.605/1998, a potencialidade de dano à saúde humana é suficiente para configuração da conduta delitiva, haja vista a natureza formal do crime, não se exigindo, portanto, a realização de perícia.
EREsp 1.417.279-SC, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, por unanimidade, julgado em 11/04/2018, DJe 20/04/2018

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